Andar ou Parar: Deixar a esquerda livre nas escadas rolantes ajuda ou atrapalha a mobilidade urbana?

A pressa de uns e a espera de outros
João sempre sai de casa no limite do tempo. Ele sabe que qualquer atraso pode fazer a diferença entre chegar pontualmente ou perder a primeira reunião do dia. No metrô, ao avistar as escadas rolantes, já se posiciona estrategicamente do lado esquerdo. Apressado, desvia dos passageiros parados à direita e sobe os degraus rapidamente. A estratégia funciona e ele consegue embarcar no último segundo.
Por outro lado, Maria, que está voltando do trabalho depois de um expediente exaustivo, não tem a mesma pressa. Como tantos outros passageiros, prefere apenas se posicionar na escada e deixar que o equipamento faça o trabalho. No entanto, precisa esperar na base da escada enquanto outras pessoas sobem pelo lado esquerdo, pois a metade da escada precisa permanecer livre para os mais apressados. O tempo de espera aumenta, a fila cresce e sua paciência se esgota.
Essa cena, comum nos grandes centros urbanos, levanta um dilema interessante: será que manter um lado da escada livre para quem tem pressa realmente melhora a mobilidade para todos ou apenas beneficia alguns em detrimento do coletivo? Embora o costume de liberar a esquerda pareça eficiente para quem deseja se deslocar mais rapidamente, pesquisas apontam que essa prática pode, na verdade, reduzir a capacidade da escada rolante, aumentar o tempo de espera para a maioria e até mesmo gerar riscos à segurança.
O que dizem os estudos?
Um experimento realizado na estação de metrô de Holborn, em Londres, trouxe uma nova perspectiva sobre o uso das escadas rolantes. Durante três semanas, pesquisadores analisaram a movimentação dos passageiros em escadas de 23,4 metros de extensão.
Normalmente, o comportamento dos londrinos era semelhante ao visto em São Paulo e em outras metrópoles: o lado direito era ocupado por aqueles que ficavam parados, enquanto o esquerdo permanecia livre para quem queria caminhar. No entanto, quando os passageiros foram incentivados a ocuparem ambos os lados sem se mover, os pesquisadores notaram um aumento de até 30% na capacidade das escadas rolantes.
Isso significava que mais pessoas conseguiam passar em menos tempo, reduzindo congestionamentos e melhorando o fluxo geral. A explicação é simples: a maioria das pessoas prefere não caminhar na escada rolante. Quando metade dela precisa ficar vazia para um pequeno número de indivíduos que escolhem se movimentar, o espaço acaba sendo mal aproveitado.
Paul Stoneman, engenheiro de transportes responsável pelo estudo, destaca que essa mudança pode parecer pequena, mas tem grande impacto. Segundo ele, liberar um lado da escada pode ajudar um ou outro indivíduo, mas prejudica o grupo como um todo. Quando mais passageiros ocupam a escada sem andar, o fluxo se torna mais estável e contínuo, beneficiando muito mais gente.
O impacto na segurança
Além da eficiência, outro aspecto essencial desse debate é a segurança. A diferença entre passageiros parados e outros caminhando cria um ambiente propício para acidentes. Em horários de pico, quando o número de usuários é maior e as escadas estão mais cheias, a possibilidade de tropeços, empurrões e quedas aumenta significativamente.
O problema se agrava ainda mais para idosos, crianças e pessoas com mobilidade reduzida. Qualquer desequilíbrio pode ser suficiente para causar uma queda e, em espaços cheios, um acidente pode ter consequências graves.
Diante dessa preocupação, algumas cidades já começaram a modificar sua abordagem. Em Hong Kong, por exemplo, campanhas foram implementadas para incentivar a ocupação completa das escadas rolantes, priorizando a segurança e o fluxo eficiente. No Japão, um país conhecido pela disciplina de seus passageiros no transporte público, algumas estações começaram a alertar sobre os riscos de caminhar nas escadas rolantes, incentivando os usuários a ficarem parados.
E no Brasil?
No Brasil, especialmente em São Paulo, essa prática de liberar o lado esquerdo para quem deseja caminhar está amplamente consolidada e reforçada pela rotina diária dos passageiros. Além disso, no metrô paulistano, adesivos e sinalizações orientam os passageiros sobre essa regra informal, consolidando-a como um código de conduta não escrito.
Por outro lado, as operadoras do transporte público implementam medidas que vão contra essa prática. Com frequência, as escadas rolantes são desligadas em horários de grande movimento para conter a superlotação nas plataformas, evidenciando que a ideia de incentivar um fluxo livre e rápido perde o sentido quando a própria infraestrutura não permite que isso aconteça.
Possíveis soluções
Enquanto essa mudança não ocorre, algumas medidas podem ajudar a otimizar o fluxo de passageiros nas escadas rolantes:
- Melhorar a frequência dos trens, reduzindo o tempo de espera nas plataformas e a necessidade de pressa.
- Instalar mais escadas fixas e elevadores bem distribuídos.
- Diferenciar escadas por tipo de uso, separando aquelas para quem deseja caminhar daquelas destinadas apenas a quem quer permanecer parado.
Veja também:
Conclusão
A prática de liberar um lado da escada rolante para quem tem pressa pode parecer vantajosa individualmente, mas compromete a eficiência e a segurança do sistema como um todo.
Enquanto alguns passageiros conseguem economizar alguns segundos, a maioria acaba esperando mais tempo para acessar a escada, além de correr riscos desnecessários de acidentes